domingo, 29 de novembro de 2009

PECADOS CAPITAIS (43)

7. ORGULHO

7.5. O RISO

"A Poética, de Aristóteles, estuda a tragédia grega, sendo um clássico inestimável na definição da arte. O filósofo promete ocupar-se da comédia, mas, se o livro foi escrito, não chegámos a conhecê-lo.
Sobre este assunto, Umberto Eco escreveu O Nome da Rosa, um policial passado na Idade Média. A trama do best-seller – que deu um filme – cria a ficção de A comédia, de Aristóteles, ter sido destruída num convento dominicano, de modo a evitar o escândalo do seu conhecimento.
Aristóteles avisa que a comédia não merece ser escrita, pois ocupa-se das acções de homens vulgares, ao contrário da tragédia, que desenvolve com nobreza a condição radical da Humanidade. Na Idade Média, houve uma heresia que afirmava que Deus tinha criado o mundo a rir. Da boca aberta de Deus saíra a matéria e a vida.
A questão não é ligeira. Hoje em dia assistimos a algo muito parecido, com o riso diabólico da maioria dos nossos comediantes, que arruínam toda a tentativa de erigir um sentido legítimo para a vida dos seres humanos.
Os franciscanos introduziram – ainda na Idade Média – um outro tipo de riso: o da alegria perante a festa da Criação. Tudo é belo e bom e, portanto, digno do sorriso santo e agradecido.
Mas o riso que está directamente relacionado com o orgulho é o de alguém que ri de si próprio. O orgulhoso não ri de si mesmo. Faz escárnio dos outros, ridiculariza tudo o que há de mais sagrado no esforço humano de edificar o mundo – mas, de si, o orgulhoso não dá uma única gargalhada que seja. É fácil de compreender que rir de si próprio é uma qualidade raríssima.
O orgulhoso é muito sério, mesmo quando faz chacota. A boca dele abre-se, mas os olhos estão gelados. Por dentro está em pranto.
" - Mário Cabral in Diário Insular

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