domingo, 9 de novembro de 2008

Açores: Estatuto e Autonomia


A propósito do veto do Presidente da República à última versão do Estatuto Político-administrativo dos Açores, quero começar por dizer que no plano dos princípios concordo com quem defende o Estatuto. Mais adiante aprofundarei porque digo apenas no plano dos princípios.
Não seria de esperar outra atitude da parte de Cavaco Silva conhecidas que são as suas tendências centralistas. As dele e as da grande maioria da classe política de Lisboa (e aqui incluo as estruturas nacionais de todos os partidos representados na Assembleia da República).
Não estranhemos também mais este episódio, pois é também natural que a Autonomia se enquadre num processo de conquista gradual, logo naturalmente conflituoso, em relação a um poder tradicionalmente centralista e cioso dos seus poderes.
Não obstante estas considerações, estou convencido que, quer para mim quer para a grande maioria das pessoas que de alguma forma se interessam por estes assuntos, a Regionalização e a Autonomia da Região são realidades que dificilmente regredirão para um cenário pré-25 de Abril, com o sem os artº. 114º e artº. 140º.
Aliás, a discussão em torno daqueles artigos, para além de alguma classe política e imprensa locais, tem passado ao lado da grande maioria das pessoas.
Este alheamento tem, em minha opinião, várias causas, das quais quero destacar duas: a primeira o facto de a grande maioria das pessoas ter como adquirido o facto dos Açores serem uma Região Autónoma, realidade que dificilmente será alterada por dois obscuros artigos do Estatuto Político-administrativo e a segunda o facto de sentirem que este modelo de Autonomia está esgotado necessitando, por isso, de evoluir.
Sobre a primeira das causas creio não haver mais considerações a fazer. Sobre a segunda, temos assunto para muitas e longas teses.
Um dos defeitos do actual modelo é, em minha opinião, ter-se transposto para a Região muitos dos modelos de poder centrais, logo centralistas por natureza. Resumindo, criaram-se internamente centralismos que necessitam de ser corrigidos.
Concordo com o reitor da Universidade do Açores, quando diz na entrevista publicada na Revista do Diário Insular deste fim-de-semana que necessitamos de teóricos da Autonomia, que produzam teoria política sobre este assunto.
Discordo quando sugere que esses teóricos surjam ligados à Universidade. E isto por uma simples razão: a Universidade dos Açores, não obstante a sua tripolaridade, é um fruto dos centralismos internos, logo incapaz, em minha opinião, de produzir modelos que quebrem os paradigmas deles dependentes.
Não creio que alguma vez, na teorização que venha a ser desenvolvida com origem na Universidade dos Açores, a realidade “ilha” venha a ser integrada num modelo político de Autonomia equilibrado. E porquê? Porque o poder na Região simplesmente não sente essa realidade e as dificuldades a ela inerentes.
Vou tentar sintetizar: tentem imaginar uma Região em que o Governo tinha sido instalado nas Flores em vez de S. Miguel, em que a Universidade estava no Pico em vez de S. Miguel, na Graciosa em vez da Terceira e em S. Maria em vez da Horta e que o parlamento estava em S. Jorge.
Teríamos hoje decerto uma Região muito diferente. Mas também, estou convencido, mais equilibrada e com menos tiques de centralismo lisboeta.
É por todos estes motivos que no início deste texto referi que, no plano dos princípios, concordo com quem defende o Estatuto, mas também acho que é urgente encontrar-se um novo modelo para bem do futuro da própria Autonomia.
É determinante que todos se identifiquem com ela e isso só vai acontecer quando o Presidente do Governo Regional puder ser natural de qualquer uma das nove ilhas.
Como não sou nem Filósofo, nem Jurista, nem tão pouco um cidadão com aspirações à política activa, deixo aqui o mesmo tipo apelo do reitor da Universidade do Açores: teóricos de uma nova Autonomia precisam-se.

2 comentários:

  1. Não sei se iria tão longe quanto ao modelo de descentralização das instituições políticas regionais.

    De qualquer modo, concordo em absoluto que falta pensar novos modelos de descentralização que tenham efectivamente em conta todas as ilhas da região.

    O bicamaralismo seria uma solução, mesmo que implicasse reduzir o número de deputados da ALR? É uma hipótese...

    Conselhos de Ilha com efectivo poder na definição das políticas regionais? É outra hipótese...

    Parabéns pelo blog.

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  2. Agradeço e retribuo o V/simpático comentário.

    Relativamente à Regionalização e à Autonomia, há que ter audácia nos processos pois, creio, só assim se podem dar pequenos e decisivos passos. Como disse nos meus posts, todos eles são conquistas e nunca ofertas dos poderes centrais. Logo é necessária alguma conflitualidade.

    Em relação a agrupamentos de Câmaras Municipais tenho grandes reservas pela própria natureza do poder municipal e pela relação de forças entre estas e o poder regional: os centralismos internos tiram muito do poder que eventualmente poderiam ter.

    Os Concelhos de Ilha seriam uma hipótese interessante mas a sua composição, poderes e estatuto teriam de ser completamente repensados. Não nos podemos esquecer que eles existem mas não têm uma real influência na vida política das ilhas.

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