domingo, 9 de novembro de 2008

Portugal e a Regionalização

Tendo passado ontem 10 anos sobre o referendo da regionalização e a propósito do que se tem dito e escrito sobre o veto do Presidente da República à última versão do Estatuto Político-administrativo dos Açores, era natural que a discussão sobre a regionalização do nosso território continental voltasse à agenda política.

Tal não aconteceu e, confesso, espantar-me-ia se tal acontecesse tal é o pavor da classe política nacional em relação a este assunto. Todas as estruturas nacionais de todos os partidos com representação parlamentar, e não só, são, em minha opinião, centralistas e têm uma grande relutância em perceber e aceitar qualquer processo de regionalização.

Considero que o referendo de 8 de Novembro de 1998 foi um erro, pois a regionalização está inscrita na nossa Constituição e foi já implementada nos Açores e na Madeira. Não há pois qualquer razão para que o mesmo processo não ocorra no restante território nacional.

Foi um erro, porque, estou convencido, foi promovido com o intuito de travar o processo por muito tempo (já passaram 10 anos e estou certo que passarão mais 20 sem que o processo avance de novo), pois foi feito sem qualquer discussão ou reflexão séria. O mapa proposto era completamente absurdo, esquecendo que as regiões já existem naturalmente. Centrou parte da discussão em torno das capitais, apelando a algum bairrismo doentio, quando estas não servem para rigorosamente nada (os Açores não têm capital nem precisam). Foram acenados alguns fantasmas de desmoronamento da coesão nacional, mais próprios de um salazarismo fora de moda e sem qualquer sentido.

É claro que a regionalização tem um preço e tem até inconvenientes (falarei deles quando escrever do Estatuto do Açores), mas enquanto ferramenta de desenvolvimento é determinante.

Sendo natural de uma cidade (Peniche) sede de concelho e localizada a apenas escassos 80 km de Lisboa, ambos com a dimensão geográfica e humana da cidade onde vivo (Angra) e do concelho de que é sede, mas a cerca de 1 800 km de Lisboa, era espectável que Peniche beneficiasse da proximidade de Lisboa e tivesse um nível social e cultural muito superior a Angra. Puro engano.
A diferença existe de facto, mas a favor de Angra e a razão reside, em minha opinião, no facto de a distância ao poder ser, apesar da distância a Lisboa, mais curta em Angra do que em Peniche.

Em Angra o poder (regional) tem rosto, é nosso vizinho e é responsabilizável em relação aos seus compromissos. Em Peniche não, perde-se nos corredores labirínticos do poder (central) em Lisboa. Peniche precisa de pertencer a uma região, que embora já exista, ainda não é (nem tem) poder.

Quem tem medo da regionalização afinal? Toda a classe política de Lisboa, sentada confortavelmente à mesa do orçamento. Regionalizar significaria tirar protagonismo e poder a toda essa classe política.

Qual o problema de termos os algarvios, os minhotos, os alentejanos, os transmontanos e todos os habitantes das restantes regiões continentais a tomarem conta dos destinos de cada uma delas, mesmo como regiões autónomas (se isso fosse a sua vontade)? Nenhum. Nem o fantasma salazarista da coesão nacional em risco faz qualquer sentido, pois mesmo sem regionalização estas regiões já existem, os Açores e a Madeira são autónomas, e nunca esteve em causa a Nação que lhes é comum. Nem mesmo nos Açores e na Madeira com os movimentos independentistas dos anos 70 (e se alguma vez houver dúvidas referendem sem medos nem complexos e perguntem às respectivas populações o que querem ser; é a regra em todas as democracias a sério).

Vai sendo tempo de mudar o país macrocéfalo e assimétrico que é Portugal: com uma cabeça gigantesca (e às vezes tonta) em Lisboa, com 75% da sua população a viver no litoral entre Setúbal e Viana do Castelo e com o resto do território a desertificar e a envelhecer.

Sei que existem Constitucionalistas, Sociólogos, Politólogos, etc., e até alguns concidadãos meus dispostos apresentar inúmeros argumentos contra estas minhas posições, entre eles o mais popular: vamos criar mais uma classe política intermédia entre a nacional e municipal. É verdade e esse é um entre os muitos outros custos que qualquer processo político acarreta. E a minha resposta já a dei quando comparei Peniche com Angra.

Outro dos argumentos com alguma popularidade entre centralistas é a sugestão que a associação de interesses entre municípios poderá substituir as Regiões. E porque não chamar-lhes Regiões, pois é afinal o que tais associações seriam?

Enquanto regionalista, que me considero, respeito-os mas o país (a Nação, mãe Pátria, a Mátria da Natália Correia, que cresci aprendendo a amar e respeitar) que temos hoje é a imagem dos seus argumentos e não gosto dela (da imagem).

Considero por isso urgente, não mais referendos inúteis sobre o tema, com foi, infelizmente o de 1998, mas uma discussão sem medo das palavras, sem preconceitos nem complexos que coloque nas mãos dos cidadãos os seus destinos e o desenvolvimento a que têm direito.

2 comentários:

  1. Caro Rogerio Pereira,

    Dada a temática abordada, tomei a liberdade de publicar este seu "post", com o respectivo link, no
    .
    Regionalização
    .

    Cumprimentos

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  2. Agradeço a honra e a oportunidade de decobrir o V/blog cujo conteúdo é excelente. Bem haja.

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